sexta-feira, 4 de outubro de 2013

À beira do fundo

 O fundo é realmente o fundo. Contudo a beira do fundo ainda não é fundo. É o mais próximo lugar que há do fundo, mas ainda não é o fundo. Nascer pode ser o fundo de uma gravidez. Crescer pode ser o fundo da infância. Casar pode ser o fundo de um romance. O divorcio pode ser o fundo de um casamento. O fundo de uma saudade pode ser a perda. O desapego pode ser o fundo de uma possessão. A fé pode ser o fundo de uma crença. Mas quando estamos à flor, à margem, à beira desses episódios que  a vida inevitavelmente nos escala como protagonistas; é que nos questionamos profundamente quanto aos sentimentos envolvidos com cada um destes momentos.

Doravante, quando nos encontramos à beira de situações que mudarão todo o curso de nossas vidas nos questionamos sem precauções, nos questionamos sem meias verdades; não nos enganamos, não pincelamos esmalte cintilante em sentimentos outrora evitados.  Uma mulher enquanto gestante vive um dos momentos de maior introspecção de sua vida; por mais inquieta e alvoroçada que seja esta pessoa, quando depara-se com a formação de um outro ser dentro de seu ventre ela automaticamente aprende a arte de sensibilizar-se com aquele momento, os questionamentos são insones e acordam até dentro dos seus sonhos.  A inquietação com o que será do seu futuro e do futuro de sua prole, acompanha os seus nove meses, agora imagine o que acontecem quando poucas semanas precedem o parto... poucos dias... poucas horas...poucos minutos...segundos! 

O fim da infância é outro um momento marcante na vida, a infância é o perfume de nossas histórias. Mas sair dela também precede um choque. Até que um dia (frio ou não) você encontra outra pessoa que te percebe de uma forma singular às demais e outra tensão é se firmar na certeza de que você realmente precisa compartilhar sua vida ou na certeza que o individualismo que você conserva é mais saboroso e indispensável. Conheço tanto quanto você o fundo de algumas verdades, talvez eu conheça um pouco mais pois eu quase sempre sou o mais engraçado dos meus ciclos de amigos, também por ter a graça de um dia ter tropeçado num jarro durante uma séria palestra religiosa. Ou talvez por que eu seja o único que eu conheço que já foi assaltado pelo mesmo bandido três vezes em uma semana. Mas também posso conhecer mais um pouco do fundo de algumas tristezas por que perdi dezenas de amigos e alguns parentes em uma catástrofe que a mídia não divulgou.

  O fundo é sempre o mesmo, mas a beira do fundo pode ser uma experiência inesquecível pra quem esta atento. As expectativas são as correntes que vinculam o presente com todo o futuro. E visto que o fundo já é o fundo, não há mais expectativas. Contudo à beira do fundo é onde existem as mais enlouquecidas ansiedades que marcam pra sempre.

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